O Cerrado é amplamente conhecido como o segundo maior bioma do Brasil e uma das savanas tropicais mais biodiversas do mundo. Com seus campos abertos, árvores retorcidas e uma fauna singular, esse ecossistema ocupa cerca de 24% do território brasileiro e é considerado uma joia natural do país.
Mas será que o Cerrado é exclusivo do Brasil? Ou será que ele ultrapassa as fronteiras?
Essa pergunta nos leva a um tema fascinante: existem áreas de Cerrado em outros países da América do Sul? A resposta é sim — embora o Cerrado brasileiro seja o mais extenso e estudado, há regiões com formações savânicas muito semelhantes no Paraguai, na Bolívia e, em menor escala, no Peru.
Compreender essa distribuição internacional do Cerrado é essencial para reconhecer o valor ecológico dessas áreas além das divisas políticas.
Ao olhar para além do mapa do Brasil, percebemos que o Cerrado é parte de um mosaico de paisagens interligadas, que abrigam espécies, saberes tradicionais e desafios ambientais comuns. Conhecer essas variantes do bioma nos ajuda a valorizar a riqueza natural sul-americana e a fortalecer estratégias de conservação em escala continental.
Cerrado no Paraguai
Localização e extensão
Embora menos conhecido, o Paraguai também abriga áreas de Cerrado em seu território, especialmente na Região Oriental, que compreende os departamentos de Amambay, Concepción, San Pedro e Canindeyú. Essas regiões formam uma faixa de savana estacional tropical, conectando-se ecologicamente com o Cerrado brasileiro que se estende pelo Mato Grosso do Sul. Embora não tão vasto quanto o Cerrado no Brasil ou na Bolívia, esse corredor verde possui relevância ecológica e funciona como uma ponte biogeográfica entre diferentes ecossistemas da América do Sul.
Características da vegetação
A vegetação do Cerrado paraguaio apresenta paisagens campestres com gramíneas predominantes, entremeadas por arbustos e árvores esparsas. Assim como no Brasil, a vegetação é adaptada a solos pobres e às estações secas e chuvosas bem definidas. Espécies como a Curatella americana (conhecida popularmente como lixeira) e algumas Qualea spp. são frequentes, reforçando as semelhanças florísticas entre os dois países. No entanto, o Cerrado no Paraguai tende a ser um pouco mais úmido em certas áreas e apresenta uma transição mais rápida para florestas e campos abertos.
Fauna típica
A fauna do Cerrado paraguaio também reflete sua afinidade com o bioma brasileiro. Tamanduás-bandeira, tatus-canastra, onças-pardas e uma variedade de aves campestres como o carcará, a seriema e pequenos passeriformes adaptados às áreas abertas são comuns. Essas espécies dependem das formações savânicas para abrigo, alimentação e reprodução — e sua presença reforça a importância de preservar esse ecossistema pouco reconhecido.
Situação atual
Apesar de sua relevância ecológica, o Cerrado no Paraguai enfrenta pressões intensas. A expansão da soja e da pecuária, incentivada pela abertura de novas fronteiras agrícolas, tem levado à conversão acelerada de áreas naturais em monoculturas e pastagens. O nível de proteção ambiental é baixo, e as políticas específicas para as savanas tropicais são limitadas.
Cerrado na Bolívia
Localização e fisionomias
A Bolívia abriga uma das porções mais significativas do Cerrado fora do Brasil, concentrada principalmente no departamento de Santa Cruz, na região conhecida como Chiquitanía. Essa área é um verdadeiro mosaico de paisagens savânicas, com formações que variam entre cerradão (vegetação mais densa), cerrado ralo, campo limpo, veredas (com presença de buritis) e até áreas de murundus, pequenas elevações de solo características desse tipo de ambiente. Essa diversidade de fisionomias torna o Cerrado boliviano uma das regiões savânicas mais complexas e ecologicamente ricas da América do Sul.
Flora
A vegetação do Cerrado boliviano possui muitas espécies em comum com o Cerrado brasileiro, como o pequi (Caryocar brasiliense) e o baru (Dipteryx alata), mas também revela uma interessante mistura com elementos da Amazônia e do Chaco. Isso resulta em uma composição botânica única, que combina árvores de casca grossa, arbustos resistentes ao fogo e gramíneas adaptadas ao clima seco. Além das espécies típicas, há registros de flora endêmica, ou seja, que só existe naquela região, o que reforça o valor da Chiquitanía como hotspot de biodiversidade.
Fauna
No que se refere à fauna, o Cerrado boliviano mantém uma composição bastante semelhante à do Brasil, abrigando espécies como o lobo-guará, o tamanduá-bandeira, o tatu-canastra e a onça-parda. A região também serve de habitat para uma grande variedade de aves campestres, répteis e insetos que dependem das savanas abertas para sobreviver. Muitas dessas espécies transitam entre o Cerrado, o Chaco e a Amazônia, o que destaca o papel ecológico estratégico da região como zona de conexão biológica entre biomas.
Situação atual
Apesar de sua importância ecológica, o Cerrado boliviano enfrenta ameaças crescentes. Nos últimos anos, a região tem sido palco de incêndios florestais de grande escala, muitos deles associados à expansão agrícola e ao uso indiscriminado do fogo para limpeza de áreas. O avanço da fronteira agrícola tem provocado fragmentação dos habitats naturais.
Ainda assim, a Bolívia conta com áreas protegidas importantes, como o Parque Nacional Noel Kempff Mercado, Patrimônio Natural da Humanidade pela UNESCO, que abriga porções bem preservadas de Cerrado e desempenha um papel vital na conservação regional. A longo prazo, equilibrar desenvolvimento e proteção será o grande desafio para essa porção boliviana do bioma.
Cerrado no Peru
Onde ocorre
Embora o Cerrado não seja amplamente reconhecido no território peruano, existem pequenas porções de formações savânicas que compartilham características ecológicas com o bioma brasileiro. Essas áreas estão localizadas principalmente nas regiões de Madre de Dios e Puno, no sudeste do Peru, junto à tríplice fronteira com o Brasil (Acre) e a Bolívia. Inseridas numa zona de transição entre a Amazônia e os contrafortes andinos, essas savanas úmidas formam paisagens campestres intercaladas com florestas abertas, desempenhando um papel ecológico fundamental como corredor entre grandes ecossistemas.
Vegetação
A vegetação dessas áreas é marcada por campos com gramíneas, arbustos baixos e palmeiras, especialmente o buriti (Mauritia flexuosa), que domina zonas mais úmidas. Diferente do Cerrado brasileiro, há menor diversidade de árvores típicas como pequi e lixeira, e a composição florística se aproxima de uma savana amazônica. Ainda assim, essas formações apresentam adaptações ao solo ácido e à alternância de períodos secos e chuvosos, características compatíveis com ambientes de Cerrado.
Fauna
A fauna encontrada nessas savanas peruanas inclui espécies de ambientes abertos, como o veado-campeiro, o tamanduá-bandeira, além de araras, seriemas e outras aves campestres. A presença dessas espécies reforça a afinidade ecológica com o Cerrado, embora a diversidade faunística seja menor e influenciada por elementos da floresta tropical próxima. A fauna do Cerrado peruano, portanto, reflete um mosaico de espécies savânicas e amazônicas em equilíbrio delicado.
Desafios e conservação
O principal desafio para essas áreas é a falta de reconhecimento oficial: por não serem categorizadas como um bioma próprio ou parte formal do Cerrado, muitas dessas formações ficam fora das políticas públicas de conservação. Sem uma delimitação clara ou proteção adequada, essas savanas correm o risco de desaparecer silenciosamente, mesmo com seu alto valor ecológico como áreas de transição.
Comparativo geral: semelhanças e diferenças
Paraguai
Há árvores esparsas e gramíneas; Mamíferos e aves típicas do Cerrado. Baixa proteção e alta conversão agrícola Apresenta aproximadamente 25 espécies de fauna ameaçadas, incluindo o tamanduá-bandeira e o lobo-guará
Bolívia
Alta diversidade da flora e fauna muito semelhante a do Cerrado brasileiro Proteção parcial, com grande ameaça por fogo Pelo menos 30 espécies de fauna em risco, incluindo o lobo-guará e o tamanduá-bandeira
Peru
Vegetação mais úmida, como a palmeiras buriti. Fauna de transição entre Amazônia e Cerrado Proteção pouco estudada e/ou sem proteção específica Pouco estudo sobre fauna ameaçada, mas possíveis riscos para espécies como o veado-campeiro
Brasil
Alta diversidade, com grande variedade de árvores frutíferas. Fauna rica e diversificada, inclusive com proteção em áreas de conservação. Há ameaças por desmatamento e fogo, além de 100 espécies ameaçadas e em vulnerabilidade, incluindo o lobo-guará, onça-pintada e tamanduá-bandeira
O bioma ultrapassando as fronteiras geográficas.
O Cerrado é um bioma que ultrapassa as fronteiras do Brasil, estendendo-se para o Paraguai, Bolívia e Peru, onde assume formas semelhantes, mas com particularidades que refletem as características locais de cada país.
Embora as áreas de Cerrado fora do Brasil sejam menores e muitas vezes menos conhecidas, elas desempenham um papel crucial na conectividade ecológica da América do Sul, funcionando como corredores naturais entre diferentes biomas, como a Amazônia, o Chaco e as Florestas Andinas.
Apesar das diferenças locais em termos de vegetação, fauna e clima, os países que compartilham fragmentos desse bioma enfrentam desafios comuns. O desmatamento, o uso do fogo para manejo da terra e a falta de proteção formal são ameaças reais e urgentes para a preservação dessas áreas.
Se esses ecossistemas únicos não forem protegidos de maneira eficaz, corremos o risco de perder não apenas a biodiversidade local, mas também a conexão vital entre diferentes ecossistemas sul-americanos.
Valorizar e conservar o Cerrado — e suas variantes fora do Brasil — é essencial para a saúde ambiental do continente.
Equilíbrio climático global e elos ecossistêmicos fundamentais.
Essas áreas não são apenas importantes para as espécies que nelas habitam, mas também para o equilíbrio climático global, sendo responsáveis por serviços ecossistêmicos fundamentais, como a regulação hídrica e o sequestro de carbono. Preservar o Cerrado é, portanto, um compromisso com a biodiversidade, a sustentabilidade e o futuro do nosso planeta.
Principais Iniciativas Oficiais de Preservação do Cerrado em Cada País
O Cerrado, um dos biomas mais biodiversos do mundo, enfrenta sérios desafios de preservação em todos os países onde ocorre. Cada nação tem suas próprias estratégias e iniciativas para proteger este ecossistema único, e, embora ainda haja muito a ser feito, algumas ações têm se mostrado cruciais para garantir sua sobrevivência. A seguir, destacamos as principais iniciativas de preservação do Cerrado nos países em que ele se encontra: Brasil, Paraguai, Bolívia e Peru.
O Brasil, onde o Cerrado ocupa uma vasta área, é o país com as políticas de preservação mais estruturadas. Algumas das principais iniciativas incluem:
Parques Nacionais e Unidades de Conservação (UCs)
O Brasil tem uma extensa rede de unidades de conservação, com destaque para os Parques Nacionais de Brasília, Chapada dos Veadeiros e Emas, que protegem importantes áreas do Cerrado. O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) garante a preservação de diversas áreas representativas do bioma.
Código Florestal Brasileiro
A legislação nacional, especialmente o Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651/2012), exige que propriedades rurais mantenham uma Reserva Legal e protejam Áreas de Preservação Permanente (APPs), ajudando na conservação do Cerrado.
Projetos de Restauração e Recuperação Ecológica
Programas como o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento (PPCD) e o Projeto Cerrado, que visa restaurar áreas degradadas, são fundamentais para a recuperação do bioma. Além disso, iniciativas locais de restauração buscam restaurar a vegetação nativa e promover práticas agrícolas sustentáveis.
Paraguai
Embora o Cerrado no Paraguai seja menos extenso, algumas ações de preservação têm sido tomadas, especialmente nas áreas da Região Oriental:
Parque Nacional Defensores del Chaco
Embora o Parque Defensores del Chaco seja predominantemente associado ao Chaco, ele também protege áreas de transição que incluem ecossistemas semelhantes ao Cerrado. Esse parque tem um papel importante na conservação da fauna e flora regional.
Legislação Ambiental
O Paraguai tem a Lei de Áreas Protegidas (Lei nº 352/94), que prevê a criação e o manejo de unidades de conservação em várias regiões, incluindo as áreas de Cerrado.
Na Bolívia, o Cerrado é encontrado principalmente no Departamento de Santa Cruz, onde as iniciativas de preservação estão em desenvolvimento:
Parque Nacional Noel Kempff Mercado
O Parque Nacional Noel Kempff Mercado, situado na região do Cerrado, é uma das áreas de conservação mais importantes do país. Reconhecido como Patrimônio Natural da Humanidade, o parque protege tanto o Cerrado quanto ecossistemas da Amazônia e da Chiquitanía, com rica biodiversidade.
Sistema Nacional de Áreas Protegidas
A Bolívia tem o Sistema Nacional de Áreas Protegidas (SNAP), que visa proteger ecossistemas chave do país, incluindo áreas de Cerrado. Algumas dessas áreas são protegidas por leis ambientais, mas o desmatamento e a ameaça de incêndios continuam sendo desafios significativos.
No Peru, o Cerrado ocorre em menor extensão, especialmente nas regiões de Madre de Dios e Puno, e as iniciativas de preservação são mais limitadas:
Parques Nacionais
Embora o Cerrado não seja amplamente reconhecido no país, áreas de transição entre a Amazônia e os Andes, como o Parque Nacional Manu, oferecem algum grau de proteção a ecossistemas de savanas e vegetações semelhantes ao Cerrado. Essas áreas também servem como refúgios para espécies ameaçadas.
Legislação Ambiental
O Peru possui um Sistema Nacional de Áreas Naturais Protegidas (SINANPE), que regula a criação de unidades de conservação. Embora não existam parques especificamente voltados para o Cerrado, o sistema protege diversas áreas de transição entre a Amazônia e o Cerrado.

Você sabia que o Cerrado ultrapassa fronteiras?
O Cerrado não é exclusivo do Brasil! Ele também se estende para o Paraguai, Bolívia e Peru, formando ecossistemas vitais para a biodiversidade da América do Sul. Ao conhecer mais sobre esse bioma, podemos ajudar na sua preservação e disseminação de informações cruciais. Compartilhe este post e ajude a espalhar o conhecimento sobre o Cerrado e sua conservação! Cada pequena ação conta para a proteção dessa região única e essencial para o nosso planeta.